A aquisição da Skechers pela 3G Capital, gestora de investimentos dos bilionários brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, marcou o setor de calçados com um negócio avaliado em US$ 9,4 bilhões. Anunciada em 5 de maio de 2025, a transação transforma a terceira maior empresa de calçados do mundo em uma companhia de capital fechado, encerrando quase três décadas de negociações na Bolsa de Nova York. A Skechers, conhecida pelo conforto de seus tênis e apelidada de “tênis de vovó”, agora integra o portfólio da 3G, que já controla marcas globais como AB InBev e Restaurant Brands International. O acordo, que deve ser concluído até o terceiro trimestre de 2025, reflete a estratégia da gestora de investir em empresas familiares lideradas por fundadores visionários.
A operação ocorre em um momento de desafios para o setor calçadista, especialmente devido às tarifas comerciais impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Essas políticas afetam diretamente centros de produção como China e Vietnã, onde a Skechers mantém parte significativa de sua cadeia de suprimentos. A empresa, sediada na Califórnia, opera cerca de 5,3 mil lojas em mais de 180 países, com dois terços de sua receita provenientes de mercados internacionais. A compra pela 3G Capital sinaliza confiança no potencial de crescimento da marca, especialmente em regiões como Ásia e América Latina.
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— Cat Herding Science Nerd
(@catladyactivist) May 5, 2025
O negócio também reforça a presença dos bilionários brasileiros no mercado global de calçados. Jorge Paulo Lemann e Carlos Alberto Sicupira já são acionistas da On Holding, grupo suíço que produz os tênis On Running, usados por atletas como o tenista João Fonseca. A aquisição da Skechers, portanto, amplia a influência da 3G em um setor que movimenta quase R$ 1 trilhão anualmente, segundo estimativas do mercado.
- Valor da transação: US$ 9,4 bilhões, com pagamento de US$ 63 por ação.
- Participação da 3G: Cerca de 80% da nova empresa.
- Continuidade da gestão: Robert Greenberg, fundador e CEO, permanece no comando.
- Expansão global: Prioridade para mercados na Ásia e América Latina.
História de uma marca icônica
Fundada em 1992 por Robert Greenberg, a Skechers surgiu em Manhattan Beach, Califórnia, inicialmente focada em botas e calçados casuais. Greenberg, que já havia criado a marca LA Gear, apostou em um conceito simples: conforto acima de tudo. Nos anos 1990, a empresa ganhou destaque com o modelo Chrome Dome, que conquistou o público jovem. Em 1994, a Skechers começou sua expansão internacional, priorizando mercados fora dos Estados Unidos. Hoje, a marca é a terceira maior do setor calçadista, atrás apenas de Nike e Adidas, com faturamento superior a US$ 9 bilhões em 2024.
A trajetória da Skechers é marcada por uma abordagem prática, sem seguir tendências de moda ou focar exclusivamente em desempenho esportivo. Seus tênis, conhecidos pela palmilha acolchoada e design funcional, atraem consumidores acima de 50 anos, mas também ganharam espaço entre gerações mais jovens. A empresa investe em tecnologia para aprimorar o conforto, como solados com amortecimento e materiais leves, o que a diferencia de concorrentes mais voltados para estética ou performance.
Nos últimos anos, a Skechers diversificou seu portfólio, lançando linhas voltadas para esportes, como basquete e futebol. Parcerias com atletas da NBA e jogadores de futebol reforçam essa nova direção, embora o conforto continue sendo o principal diferencial. No Brasil, onde opera desde 2007, a marca possui 15 lojas e planeja expandir sua presença, especialmente por meio de franquias.
Estratégia da 3G Capital
A compra da Skechers repete um padrão da 3G Capital: investir em empresas familiares com liderança consolidada. Em 2021, a gestora adquiriu 75% da Hunter Douglas, fabricante holandesa de persianas, mantendo o fundador à frente do negócio e a família com participação acionária. Na Skechers, a família Greenberg ficará com cerca de 20% da empresa, enquanto Robert Greenberg, seu filho Michael e o diretor de operações David Weinberg continuarão na gestão.
A 3G Capital, fundada em 2004, é conhecida por sua abordagem agressiva em aquisições e reestruturações. A gestora já controlou marcas como Kraft Heinz, em parceria com Warren Buffett, e é acionista majoritária da AB InBev, dona da Ambev. No entanto, nem todos os investimentos foram bem-sucedidos. A Kraft Heinz perdeu valor de mercado desde a fusão em 2015, com queda de 33% nas ações, levando a 3G a sair do negócio em 2023. Outro revés foi a crise das Lojas Americanas, que entrou em recuperação judicial em 2023 após uma fraude contábil de R$ 20 bilhões.
- Modelo de aquisição: Foco em empresas familiares com fundadores no comando.
- Participação acionária: Famílias mantêm fatias minoritárias, como os 20% dos Greenberg.
- Histórico da 3G: Sucessos com AB InBev e desafios com Kraft Heinz e Americanas.
- Expansão estratégica: Uso de franquias para crescer em mercados emergentes.
Apesar dos desafios, a 3G Capital vê na Skechers uma oportunidade de longo prazo. A gestora aposta na força da marca e em sua capacidade de crescer em mercados como Índia, onde a Skechers já supera a Nike em vendas, segundo executivos da empresa. A transação, financiada por recursos próprios da 3G e dívida garantida pelo JPMorgan, reflete confiança no potencial da companhia em um setor competitivo.
Impactos das tarifas comerciais
As tarifas impostas pelo governo Trump, incluindo taxas de 145% sobre importações chinesas e um imposto mínimo de 10% sobre outros países, representam um obstáculo para a Skechers. A empresa, que produz grande parte de seus calçados na China e no Vietnã, enfrenta aumento nos custos de produção. Em abril de 2025, a Skechers retirou sua projeção financeira para o ano, citando “incerteza macroeconômica” decorrente dessas políticas comerciais. A companhia já começou a ajustar preços e negociar com fornecedores para mitigar os impactos.
O setor calçadista como um todo sente a pressão. Na semana anterior ao anúncio da aquisição, a Skechers, ao lado de Nike, Under Armour e outras marcas, assinou uma carta da Associação de Distribuidores e Varejistas de Calçados da América pedindo isenção das tarifas. O documento alertava que os impostos poderiam eliminar centenas de empresas, cortar milhares de empregos e elevar preços para consumidores. Apesar dos desafios, a Skechers destaca que dois terços de suas vendas vêm de mercados internacionais, o que reduz a dependência do mercado americano.
A 3G Capital, por sua vez, parece preparada para navegar esse cenário. A gestora tem experiência em gerenciar empresas em contextos econômicos complexos, como a AB InBev durante crises globais. A decisão de tornar a Skechers uma empresa privada pode facilitar ajustes estratégicos, como realocação de produção para outros países ou investimento em tecnologias que reduzam custos.
Expansão global da Skechers
A Skechers adota um modelo de crescimento cauteloso, priorizando franquias e parcerias locais em vez de abrir lojas próprias em grande escala. Esse approccio permitiu à empresa alcançar mais de 180 países, com 5,3 mil pontos de venda. Na Índia, a marca já é líder em vendas, superando a Nike, enquanto na América Latina, incluindo o Brasil, a expansão é uma prioridade para os próximos anos. No Brasil, as 15 lojas atuais representam apenas o início de um plano mais ambicioso.
A empresa também investe em infraestrutura e tecnologia para sustentar seu crescimento. Nos últimos anos, a Skechers ampliou centros de distribuição na Ásia e na Europa, além de modernizar suas operações logísticas. A aposta em vendas diretas ao consumidor, por meio de e-commerce e lojas próprias, complementa a estratégia de franquias. Em 2024, as vendas internacionais responderam por 60% do faturamento, com destaque para mercados asiáticos como China e Coreia do Sul.
- Mercados prioritários: Índia, China, Coreia do Sul e América Latina.
- Modelo de expansão: Franquias e parcerias locais para reduzir custos.
- Investimentos recentes: Centros de distribuição na Ásia e Europa.
- Vendas online: Crescimento do e-commerce como canal estratégico.
- Presença no Brasil: 15 lojas, com planos de abertura de novas unidades.
A aquisição pela 3G Capital deve acelerar esses planos, com a gestora trazendo expertise em gestão e acesso a recursos financeiros. A experiência da 3G com marcas globais como Burger King pode ajudar a Skechers a otimizar sua operação internacional e fortalecer sua presença em mercados emergentes.
Perfil de Robert Greenberg
Robert Greenberg, fundador e CEO da Skechers, é uma figura central na história da empresa. Aos 83 anos, ele continua liderando a companhia, agora ao lado de seu filho Michael, presidente da Skechers, e de David Weinberg, diretor de operações. Greenberg começou sua carreira no setor calçadista com a LA Gear, marca que alcançou sucesso nos anos 1980, mas enfrentou dificuldades financeiras. Com a Skechers, ele adotou uma abordagem mais conservadora, focando em produtos acessíveis e confortáveis.
O empreendedor tem um patrimônio estimado em US$ 1,1 bilhão, segundo a Bloomberg, grande parte ligado às ações da Skechers. Sua visão de manter o conforto como diferencial da marca conquistou consumidores em todo o mundo, enquanto sua resistência a modismos garantiu estabilidade à empresa. A decisão de permanecer na liderança após a aquisição reflete a confiança da 3G Capital em sua capacidade de conduzir a Skechers em um novo capítulo.
Greenberg também é conhecido por sua habilidade em identificar tendências de consumo. Nos anos 2000, a Skechers investiu em campanhas de marketing com celebridades, como Britney Spears, para atrair públicos mais jovens. Mais recentemente, a marca firmou parcerias com atletas e influenciadores, ampliando seu alcance sem abandonar o foco no conforto.
Reações do mercado financeiro
O anúncio da aquisição impulsionou as ações da Skechers, que subiram mais de 20% no pregão de 5 de maio de 2025. O prêmio de 30% oferecido pela 3G Capital, com pagamento de US$ 63 por ação, foi bem recebido por investidores. A transação também inclui uma opção para acionistas receberem US$ 57 por ação em dinheiro, além de uma participação não negociável em uma nova holding que controlará a Skechers.
Analistas do mercado veem a compra como um movimento estratégico da 3G Capital para diversificar seu portfólio. A Skechers, com sua base sólida de consumidores e presença global, oferece um ativo estável em um setor resiliente. No entanto, alguns especialistas alertam para os riscos das tarifas comerciais, que podem pressionar as margens de lucro da empresa nos próximos anos.
- Reação das ações: Alta de mais de 20% no dia do anúncio.
- Prêmio oferecido: 30% acima do valor de mercado das ações.
- Opção para acionistas: US$ 57 por ação mais participação na nova holding.
- Riscos destacados: Impacto das tarifas comerciais nos custos de produção.
A decisão de fechar o capital da Skechers também foi interpretada como uma forma de proteger a empresa de volatilidades do mercado. Como companhia privada, a Skechers terá mais flexibilidade para implementar mudanças estratégicas sem a pressão de acionistas e relatórios trimestrais.
Presença da Skechers no Brasil
No Brasil, a Skechers opera desde 2007, mas sua presença ainda é modesta em comparação com gigantes como Nike e Adidas. As 15 lojas atuais estão concentradas em grandes centros urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro. A marca também mantém parcerias com varejistas locais, como Centauro e Netshoes, para ampliar sua distribuição. Em 2024, as vendas no Brasil cresceram 12% em relação ao ano anterior, impulsionadas pelo aumento da demanda por calçados confortáveis.
A 3G Capital, com sua experiência no mercado brasileiro por meio da Ambev e das Lojas Americanas, pode acelerar a expansão da Skechers no país. Planos para abrir novas lojas e investir em campanhas de marketing estão em discussão, segundo fontes próximas à empresa. A América Latina, incluindo o Brasil, é vista como uma região estratégica para o crescimento da marca nos próximos cinco anos.
A operação brasileira da Skechers também enfrenta desafios logísticos, como altos custos de importação e tributação. A empresa estuda parcerias com fabricantes locais para reduzir custos e atender à demanda crescente. Além disso, a Skechers planeja fortalecer sua presença online, com investimentos em e-commerce e campanhas digitais voltadas para o público jovem.
Desafios logísticos e de produção
A dependência de centros de produção na China e no Vietnã expõe a Skechers a riscos geopolíticos e econômicos. As tarifas de Trump, que entraram em vigor em 2025, aumentaram os custos de importação, forçando a empresa a rever sua cadeia de suprimentos. Nos últimos meses, a Skechers negociou com fornecedores alternativos em países como Indonésia e Bangladesh, mas a transição exige investimentos significativos.
A empresa também enfrenta pressão para manter preços acessíveis, um dos pilares de sua marca. Nos Estados Unidos, os tênis da Skechers custam, em média, entre US$ 50 e US$ 100, bem abaixo dos valores cobrados por Nike e Adidas. No Brasil, os preços variam de R$ 300 a R$ 600, o que ainda a posiciona como uma opção intermediária no mercado. Ajustes de preço devido às tarifas podem afetar a competitividade da marca.
- Países de produção: China e Vietnã concentram a maior parte da fabricação.
- Alternativas estudadas: Indonésia e Bangladesh como novos polos produtivos.
- Faixa de preço nos EUA: US$ 50 a US$ 100 por par de tênis.
- Faixa de preço no Brasil: R$ 300 a R$ 600, dependendo do modelo.
- Estratégia de mitigação: Negociação com fornecedores e investimento em logística.
A 3G Capital, com sua expertise em otimização de operações, pode ajudar a Skechers a enfrentar esses desafios. A gestora já implementou cortes de custos e reestruturações em empresas como Burger King e AB InBev, o que pode ser replicado na Skechers.
Futuro da marca sob nova gestão
A Skechers entra em uma nova fase com a aquisição pela 3G Capital. A empresa continuará investindo em inovação, com foco em tecnologias que melhorem o conforto e a durabilidade de seus calçados. Projetos para lançar novas linhas esportivas e parcerias com atletas estão em andamento, com o objetivo de atrair consumidores mais jovens e diversificar o público da marca.
A expansão na Ásia, especialmente na China e na Índia, segue como prioridade. A Skechers planeja abrir 500 novas lojas na região até 2027, muitas delas por meio de franquias. Na América Latina, o Brasil é visto como um mercado-chave, com potencial para dobrar o número de lojas nos próximos três anos. A 3G Capital deve aportar recursos para acelerar esses planos, além de trazer sua experiência em gestão para otimizar operações.
A liderança de Robert Greenberg, combinada com a visão estratégica da 3G, posiciona a Skechers para competir em um mercado dominado por gigantes. A marca, que começou como uma opção de nicho para consumidores em busca de conforto, agora tem a chance de consolidar sua posição como uma das líderes globais do setor calçadista.