A televisão brasileira prepara-se para reverenciar uma de suas maiores ícones com a estreia de “Glória”, uma minissérie documental em quatro episódios que celebra a vida e a carreira de Glória Maria. Marcada para 27 de abril, a produção será exibida aos domingos, após o “Fantástico”, como parte das comemorações dos 60 anos da Globo. Dirigida por Danielle França e com roteiro de Paulo Sampaio, a série promete mergulhar nas cinco décadas de contribuições da jornalista, desde suas primeiras reportagens até as viagens que a levaram a mais de 100 países. Depoimentos de familiares, amigos e colegas, como Roberto Carlos, Maria Bethânia e Pedro Bial, compõem um retrato íntimo de uma mulher que quebrou barreiras e inspirou gerações.
Nascida em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, Glória Maria começou sua trajetória na Globo de forma humilde, como radioescuta, buscando informações em delegacias para o “Jornal Nacional”. Sua determinação a levou rapidamente à frente das câmeras, onde se destacou pela coragem e carisma. A minissérie resgata momentos históricos, como sua entrada ao vivo no “Jornal Nacional” em 1977, a primeira do gênero na televisão brasileira, e entrevistas com figuras globais como Michael Jackson e Madonna. O documentário também aborda os desafios pessoais e profissionais enfrentados por Glória, incluindo episódios de racismo que marcaram sua carreira.
A produção não se limita a feitos jornalísticos. As filhas de Glória, Maria e Laura, adotadas em 2009, compartilham memórias pessoais, enquanto colegas como Maju Coutinho destacam seu impacto na representatividade. A minissérie promete emocionar ao mostrar como Glória transformou obstáculos em oportunidades, deixando um legado que vai além da tela.
Primeiros passos de uma pioneira
Glória Maria entrou na Globo em 1970, ainda estudante de jornalismo na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Seu primeiro papel, como radioescuta, exigia ligar para delegacias e bombeiros em busca de notícias quentes. Apesar da função discreta, ela logo mostrou talento para a apuração, conquistando a confiança dos editores. Em 1971, sua estreia como repórter aconteceu na cobertura da queda do Elevado Paulo de Frontin, no Rio, um acidente que marcou a cidade e revelou sua habilidade em narrar fatos com clareza e sensibilidade.
A ascensão de Glória na emissora foi meteórica. No início dos anos 1970, ela passou a integrar equipes de telejornais locais, como o “RJTV” e o “Bom Dia Rio”. Sua presença carismática e sua capacidade de se conectar com o público abriram portas para coberturas nacionais. Em 1977, ela fez história ao participar da primeira transmissão ao vivo do “Jornal Nacional”, um marco técnico e jornalístico que solidificou sua posição como uma das principais repórteres da Globo.
- Momentos iniciais que definiram Glória
- Estreia como repórter em 1971, cobrindo a tragédia do Elevado Paulo de Frontin.
- Primeira entrada ao vivo do “Jornal Nacional” em 1977, um marco na TV.
- Passagem por telejornais como “RJTV” e “Bom Dia Rio” na década de 1970.
- Trabalho como radioescuta, ponto de partida de sua carreira na Globo.
Enfrentando barreiras com coragem
Glória Maria nunca escondeu os desafios que enfrentou como mulher negra no jornalismo brasileiro. Em 1980, um episódio no Othon Palace Hotel, no Rio, marcou sua trajetória. Barrada na entrada por ser negra, ela transformou a indignação em ação, registrando o caso com base na Lei Afonso Arinos, que proibia a discriminação racial. A jornalista foi além e produziu uma matéria para o “Jornal Hoje”, denunciando o racismo diretamente na porta do hotel, com nome e endereço do local. O caso ganhou repercussão e reforçou sua postura combativa diante de injustiças.
Esse não foi o único obstáculo. Nos bastidores da Globo, Glória enfrentava um ambiente predominantemente masculino e branco. Sua persistência em ocupar espaços de destaque, como o “Fantástico” e o “Globo Repórter”, abriu caminho para outras jornalistas negras, como Maju Coutinho e Zileide Silva. A minissérie dedica espaço a essas lutas, mostrando como Glória transformou adversidades em combustível para sua carreira, sem nunca perder o sorriso que se tornou sua marca registrada.
A série também destaca a influência de Glória na formação de novas gerações. Mirella Archangello, conhecida como “mini Glória Maria”, é um exemplo. Aos 11 anos, Mirella conheceu sua ídola durante uma matéria do “Fantástico” e decidiu seguir o jornalismo. Em 2024, ela alcançou 960 pontos na redação do Enem, creditando à inspiração de Glória sua escolha profissional.
Viagens que marcaram o mundo
A paixão de Glória Maria por explorar o mundo a levou a mais de 100 países, um feito raro no jornalismo brasileiro. Suas reportagens no “Globo Repórter” e no “Fantástico” trouxeram ao público brasileiro culturas, paisagens e histórias de lugares como Jamaica, Japão, Índia e Nigéria. Em 2007, ela realizou a primeira transmissão em alta definição da televisão brasileira, durante uma matéria sobre a cultura Kamaiurá, no Parque Indígena do Xingu. A minissérie resgata essas viagens, mostrando como Glória combinava curiosidade com rigor jornalístico.
Entre os destaques estão suas coberturas internacionais, como a Guerra das Malvinas, em 1982, e a posse de Jimmy Carter, em 1977, nos Estados Unidos. Glória também entrevistou líderes mundiais, como Yasser Arafat, e astros de Hollywood, incluindo Harrison Ford, Nicole Kidman e Leonardo DiCaprio. Sua entrevista com Michael Jackson, em 1993, e com Madonna, em 1987, permanecem entre as mais lembradas, marcadas pela habilidade de Glória em conduzir conversas profundas com leveza.
O documentário revela bastidores dessas viagens, incluindo os desafios logísticos de filmar em locais remotos. Em uma matéria na Jamaica, por exemplo, Glória mergulhou na cultura rastafári, trazendo ao Brasil uma visão autêntica e respeitosa. Sua capacidade de se conectar com pessoas de diferentes origens transformou suas reportagens em janelas para o mundo, inspirando o público a olhar além das fronteiras.
Um ícone no “Fantástico”
Assumir o “Fantástico” em 1998 foi um divisor de águas para Glória Maria. Durante quase uma década, ela apresentou o programa ao lado de Pedro Bial, formando uma dupla que marcou época. O programa, conhecido por sua mistura de jornalismo e entretenimento, encontrou em Glória a apresentadora ideal. Sua versatilidade permitia transitar entre matérias leves, como festivais culturais, e investigações sérias, como denúncias sociais. A minissérie traz depoimentos de Bial, que relembra a química única que tinham no estúdio.
No “Fantástico”, Glória entrevistou nomes como Freddie Mercury, em 1985, e Roberto Carlos, com quem desenvolveu uma amizade duradoura. Suas matérias especiais, como a cobertura do Pride, evento de MMA no Japão, em 2003, mostraram sua capacidade de abordar temas diversos com autenticidade. A série documental recupera esses momentos, destacando como Glória transformou o programa em um espaço de inovação e representatividade.
A passagem pelo “Fantástico” também consolidou Glória como referência de estilo. Suas roupas coloridas e acessórios marcantes, muitas vezes trazidos de viagens, inspiraram o público. A minissérie explora esse lado, mostrando como ela usava a moda para expressar sua personalidade vibrante, sem jamais ofuscar o conteúdo de suas reportagens.
- Feitos marcantes no “Fantástico”
- Apresentação ao lado de Pedro Bial entre 1998 e 2007.
- Entrevistas com ícones como Freddie Mercury e Roberto Carlos.
- Cobertura do Pride no Japão, em 2003, sobre MMA.
- Matérias que misturavam cultura, esporte e denúncias sociais.
O legado no “Globo Repórter”
Após deixar o “Fantástico” em 2007, Glória Maria retornou ao “Globo Repórter”, onde encontrou o espaço perfeito para suas grandes reportagens. O programa, focado em jornalismo investigativo e cultural, permitiu que ela explorasse temas profundos, como a preservação ambiental na Amazônia e a vida em comunidades isoladas. Sua matéria sobre a festa do pequi, com os Kamaiurá, em 2007, não apenas marcou a estreia do HD na Globo, mas também fortaleceu sua conexão com os povos indígenas.
Glória permaneceu no “Globo Repórter” até 2019, quando anunciou uma pausa para tratar a saúde. Mesmo enfrentando um câncer de pulmão, diagnosticado em 2019, ela continuou gravando quando possível, demonstrando resiliência. A minissérie dedica um episódio à sua passagem pelo programa, destacando como suas reportagens elevaram o padrão do jornalismo televisivo brasileiro.
O impacto de Glória no “Globo Repórter” vai além das telas. Suas matérias inspiraram políticas públicas, como iniciativas de preservação cultural no Xingu, e tocaram milhões de brasileiros. Depoimentos de colegas como Sandra Annenberg e Maju Coutinho reforçam como Glória transformou o programa em um espaço de empatia e descoberta.
Vida pessoal e laços familiares
Fora das câmeras, Glória Maria era uma mãe dedicada. Em 2009, ela adotou Maria e Laura, então com seis meses e um ano e meio, em Salvador, após trabalhar como voluntária na Organização do Auxílio Fraterno. As filhas, hoje com 17 e 16 anos, trazem à minissérie memórias de uma mãe amorosa e determinada. Maria, a mais velha, lembra como Glória incentivava a curiosidade, levando-as a museus e viagens culturais. Laura destaca o senso de humor da mãe, sempre presente mesmo nos momentos difíceis.
A adoção das meninas marcou um novo capítulo na vida de Glória. Apesar da agenda intensa, ela priorizava a família, criando um lar cheio de afeto no Rio de Janeiro. A minissérie mostra fotos e vídeos caseiros, revelando o lado descontraído de Glória, que cantava com as filhas e organizava festas temáticas. Paulo Mesquita, tutor das meninas após a morte de Glória em 2023, também participa, compartilhando o impacto da jornalista em sua vida.
A relação de Glória com as filhas era marcada por lições de resiliência. Mesmo durante o tratamento contra o câncer, ela mantinha a rotina familiar, incentivando Maria e Laura a perseguirem seus sonhos. A série documental destaca esse equilíbrio, mostrando como Glória conciliava a carreira exigente com a maternidade.
Homenagens que eternizam Glória
A morte de Glória Maria, em 2 de fevereiro de 2023, após uma batalha de quatro anos contra um câncer de pulmão, comoveu o Brasil. Desde então, diversas homenagens reforçam seu legado. Em dezembro de 2024, o Parque Municipal Glória Maria, em Santa Teresa, no Rio, ganhou um mural do artista Eduardo Kobra, retratando o sorriso marcante da jornalista. A obra, com 4 metros de altura, simboliza sua influência duradoura.
Outra homenagem veio dos povos Kamaiurá, no Xingu, que incluíram Glória no ritual Kuarup de 2023, uma cerimônia para honrar os que partiram. Maria e Laura participaram do evento, emocionadas ao verem a mãe celebrada por uma comunidade que ela ajudou a visibilizar. A minissérie dedica espaço a essas tributações, mostrando como Glória continua inspirando mesmo após sua partida.
O Prêmio Glória Maria de Jornalismo, criado pela Câmara dos Deputados em 2024, é outro reconhecimento. A primeira vencedora, Zileide Silva, recebeu o troféu na presença de Laura, reforçando o impacto de Glória na profissão. A série documental conecta essas homenagens, destacando como elas refletem a amplitude de sua influência.
Um marco na história da Globo
A minissérie “Glória” não é apenas uma celebração individual, mas um retrato da evolução do jornalismo na Globo. Ao longo de 60 anos, a emissora transformou a forma como os brasileiros consomem notícias, e Glória Maria foi peça-chave nesse processo. Sua capacidade de inovar, seja na adoção do HD ou na cobertura de temas globais, ajudou a moldar o padrão de qualidade da emissora.
A produção também contextualiza a época em que Glória começou. Nos anos 1970, durante a ditadura militar, o jornalismo enfrentava censura e limitações. Ainda assim, ela entrevistou figuras como João Figueiredo, então presidente, com perguntas incisivas. A série resgata esses momentos, mostrando como Glória navegou um período desafiador com profissionalismo e coragem.
Os quatro episódios, exibidos entre 27 de abril e 18 de maio, prometem emocionar o público. Cada capítulo foca em uma fase da carreira de Glória, desde os primeiros passos até o impacto global de suas reportagens. A direção de Danielle França aposta em um tom intimista, com imagens de arquivo e depoimentos que revelam o lado humano da jornalista.
- Cronograma da minissérie “Glória”
- Estreia em 27 de abril, após o “Fantástico”.
- Episódios exibidos aos domingos, até 18 de maio.
- Quatro capítulos, cada um com cerca de 40 minutos.
- Disponível no Globoplay após a exibição na TV aberta.
Inspiração para novas gerações
A influência de Glória Maria transcende sua própria história. Jornalistas como Maju Coutinho, que começou como repórter de previsão do tempo, citam Glória como referência direta. A minissérie destaca esse impacto, trazendo depoimentos de profissionais que se inspiraram em sua trajetória. Zileide Silva, vencedora do Prêmio Glória Maria, fala sobre como a coragem de Glória abriu portas para mulheres negras no jornalismo.
Mirella Archangello, a “mini Glória Maria”, é outro exemplo vivo desse legado. Após conhecer Glória em 2017, ela decidiu dedicar-se ao jornalismo, conquistando uma bolsa de estudos e uma nota alta no Enem. A série documental inclui a história de Mirella, mostrando como Glória inspirou jovens de periferias a sonharem alto.
A minissérie também aborda o impacto cultural de Glória. Artistas como Emicida e Mano Brown destacam como ela trouxe questões raciais e sociais para o centro do debate, usando a televisão como ferramenta de transformação. Suas reportagens sobre a África, por exemplo, ajudaram a desconstruir estereótipos, aproximando o público brasileiro de suas raízes.
Um sorriso que não se apaga
O sorriso de Glória Maria era mais do que uma característica física; era um símbolo de sua abordagem à vida. Mesmo em coberturas difíceis, como conflitos internacionais, ela mantinha a leveza, conquistando a confiança de entrevistados e espectadores. A minissérie dedica momentos a esse traço, com imagens que mostram Glória rindo nos bastidores ou brincando com colegas.
Amigos como Djavan e Maria Bethânia relembram sua generosidade. Em depoimentos, eles contam como Glória os apoiava, mesmo com uma agenda lotada. Sua amizade com Roberto Carlos, construída ao longo de décadas, também ganha destaque, com o cantor compartilhando histórias de conversas descontraídas após entrevistas.
A produção termina com um olhar para o futuro. Maria e Laura, agora adolescentes, carregam o legado da mãe, planejando honrar sua memória com projetos sociais. A minissérie, ao mostrar essa continuidade, reforça que o impacto de Glória Maria seguirá vivo, inspirando brasileiros por gerações.
- Traços marcantes de Glória Maria
- Sorriso cativante, presente em todas as fases da carreira.
- Coragem para abordar temas difíceis, como racismo e desigualdade.
- Conexão com o público, construída por autenticidade.
- Dedicação à família, equilibrando maternidade e profissão.
- Pioneirismo em coberturas internacionais e tecnologia na TV.