Taxas de consignado disparam: trabalhadores CLT pagam até 6,49% ao mês contra 1,80% dos aposentados

Funcionários de empresas privadas que recorrem ao crédito consignado enfrentam uma realidade financeira bem mais dura do que a de aposentados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). Um levantamento recente do Procon-SP, realizado em seis bancos no estado de São Paulo, revelou que as taxas máximas cobradas para trabalhadores com carteira assinada podem chegar a 6,49% ao mês, mais que o triplo do teto de 1,80% ao mês estabelecido para os beneficiários do INSS. Essa disparidade, que reflete diferenças no perfil de risco avaliado pelas instituições financeiras, expõe a desigualdade no acesso ao crédito mais barato no Brasil. Enquanto o consignado para aposentados tem um limite fixo de juros, os celetistas dependem de convênios entre empregadores e bancos, o que muitas vezes resulta em condições menos favoráveis. O governo, no entanto, planeja mudanças com o lançamento de um novo consignado privado, que promete ampliar o acesso via aplicativo da Carteira de Trabalho Digital, mas sem um teto definido para as taxas.

A pesquisa do Procon-SP, conduzida em 10 de fevereiro, abrangeu instituições como Banco do Brasil, Bradesco, Caixa Econômica Federal, Itaú, Safra e Santander, mostrando variações significativas nas taxas oferecidas. Para trabalhadores do setor privado, o Banco Safra registrou a maior alíquota, 6,49% ao mês, enquanto o Banco do Brasil apresentou 3,26% ao mês em contratos de 12 meses. Já os aposentados do INSS mantêm uma taxa fixa de 1,80% ao mês, estabelecida pelo Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) em janeiro deste ano, após ajustes motivados pela alta da Selic, que hoje está em 12,25% ao ano. Servidores públicos, por sua vez, também têm condições melhores que os celetistas, com taxas médias de 2,82% ao mês em contratos curtos.

Bárbara Félix, especialista em direito bancário do Marcelo Tostes Advogados, explica que a diferença está no risco percebido pelos bancos. “Servidores públicos e aposentados têm estabilidade de renda garantida, enquanto trabalhadores privados enfrentam maior incerteza, como demissões”, diz. Com o novo consignado privado em vista, o governo busca facilitar o acesso ao crédito para os celetistas, mas a ausência de um teto de juros preocupa especialistas, que temem a continuidade de taxas elevadas.

Como funcionam as taxas do consignado hoje

O crédito consignado é descontado diretamente da folha de pagamento ou benefício, o que reduz o risco de inadimplência para os bancos. Apesar disso, as condições variam muito entre as categorias de tomadores. Para aposentados do INSS, o teto de 1,80% ao mês foi ajustado em janeiro deste ano, refletindo o aumento da Selic, mas ainda mantendo o consignado como uma das opções mais baratas do mercado. Já os trabalhadores do setor privado dependem de acordos entre suas empresas e os bancos, o que limita a liberdade de escolha e frequentemente resulta em taxas mais altas.

Entre os bancos pesquisados, o Itaú oferece a menor taxa para servidores públicos, 1,99% ao mês em contratos de 12 meses, enquanto o Santander lidera com a maior taxa para celetistas em contratos de 48 meses, 5,89% ao mês. A média para trabalhadores privados fica em 4,95% ao mês em prazos curtos e 4,29% em prazos longos, contra 2,94% e 1,80% para servidores e aposentados, respectivamente, em contratos de 48 meses. Essas diferenças, segundo especialistas, refletem estratégias de risco e rentabilidade de cada instituição.

A Caixa Econômica Federal destaca que suas taxas médias são competitivas, com 1,73% ao mês para servidores e 2,22% para trabalhadores privados, conforme relatório do Banco Central de dezembro de 2024. O banco atribui suas condições a fatores como risco de crédito e volatilidade econômica, mas não detalha como os convênios com empresas influenciam os valores.

O novo consignado privado e suas promessas

Anunciado pelo governo federal, o novo consignado privado deve começar em 2025, permitindo que trabalhadores CLT contratem crédito diretamente pelos aplicativos dos bancos ou pela Carteira de Trabalho Digital. Diferente do modelo atual, que exige convênios entre empresas e instituições financeiras, a novidade visa ampliar o acesso ao crédito para cerca de 40 milhões de trabalhadores formais no Brasil. No entanto, a falta de um teto fixo para as taxas de juros levanta debates sobre os reais benefícios para os celetistas.

Atualmente, o consignado para trabalhadores privados movimenta menos de 20% do total de R$ 268 bilhões em contratos ativos no país, enquanto o INSS responde por 40%, segundo dados do Banco Central. A mudança pode aumentar essa fatia, mas especialistas alertam que, sem regulação, as taxas podem permanecer altas. “Bancos que captam recursos a custos menores conseguem oferecer juros mais baixos, mas isso não é garantia para o trabalhador”, explica Bárbara Félix, apontando a influência de fatores como histórico de crédito e políticas internas das instituições.

O governo espera que a concorrência entre os bancos reduza as taxas naturalmente, mas o histórico mostra que, sem um limite, as alíquotas tendem a variar muito. Em comparação, o consignado do INSS já passou por sete reduções desde 2023, chegando a 1,66% ao mês em maio de 2024, antes do ajuste para 1,80% em janeiro deste ano, sempre acompanhando a Selic.

Diferenças gritantes entre os bancos

O levantamento do Procon-SP expôs uma ampla variação nas taxas cobradas pelos seis bancos analisados. Para contratos de 12 meses, o Banco Safra lidera com 6,49% ao mês para trabalhadores privados, enquanto o Banco do Brasil oferece 3,26% na mesma modalidade. Já o Bradesco, com 5,20% ao mês, tem as maiores taxas para servidores públicos estaduais, embora afirme que a maioria de seus contratos parte de 1,30% ao mês, dependendo do perfil do cliente.

Para prazos de 48 meses, o Santander se destaca com 5,89% ao mês para celetistas, enquanto o Safra surpreende com a menor taxa nessa categoria, 2,89% ao mês. O Itaú, por outro lado, mantém consistência com 2,20% para servidores e 4,50% para trabalhadores privados, justificando que suas taxas seguem custos operacionais e riscos de inadimplência. A Caixa, com 4,76% ao mês em ambos os prazos para celetistas, reforça que suas condições estão entre as melhores do mercado.

Essas diferenças, segundo especialistas, decorrem de estratégias distintas: alguns bancos buscam atrair mais clientes com margens menores, enquanto outros priorizam lucros maiores, mesmo com risco reduzido pelo desconto em folha. A média de 4,95% ao mês para trabalhadores privados em contratos curtos é mais que o dobro da média de 1,80% dos aposentados, evidenciando o peso do perfil de risco na precificação.

Consignado versus outras linhas de crédito

Mesmo com taxas altas para celetistas, o consignado segue como uma das opções mais acessíveis de crédito pessoal. Dados do Banco Central de dezembro de 2024 mostram que a taxa média anual do consignado para trabalhadores privados é de 40,8%, contra 21,9% para beneficiários do INSS e 23,8% para servidores. Em comparação, o cheque especial atinge 136% ao ano, enquanto o cartão de crédito rotativo dispara para 450,5% ao ano, e o parcelado chega a 171,2%.

O desconto direto na folha de pagamento é o principal fator que mantém os juros do consignado mais baixos, reduzindo o risco para os bancos. No entanto, para trabalhadores do setor privado, a falta de um teto regulado faz com que os benefícios sejam menores do que para aposentados e servidores, que têm limites definidos por lei ou acordos governamentais.

A pesquisa do Banco Central também indica que, apesar das taxas altas, o consignado privado ainda é mais vantajoso que empréstimos pessoais tradicionais, cuja média anual ultrapassa 50% em muitos casos. Isso explica por que mais de 48 milhões de contratos estão ativos no Brasil, com o INSS liderando o volume de operações.

Cronograma das mudanças no consignado

O consignado passou por várias transformações nos últimos anos, especialmente para aposentados do INSS. Veja os principais marcos recentes:

  • Janeiro de 2023: Teto do INSS reduzido para 1,91% ao mês, início de uma série de cortes.
  • Maio de 2024: Taxa chega a 1,66% ao mês, menor nível desde 2021, acompanhando a queda da Selic.
  • Janeiro de 2025: Ajuste para 1,80% ao mês, após alta da Selic para 12,25% ao ano.
  • A partir de janeiro de 2025: Novo consignado privado entra em vigor, sem teto definido.

Para os trabalhadores CLT, a expectativa é que o novo modelo traga mais opções, mas os efeitos práticos só serão vistos após a implementação. Até lá, os convênios entre empresas e bancos seguem como única alternativa.

Cuidados ao contratar um consignado

Evitar armadilhas e garantir o melhor negócio exige atenção dos consumidores. Bárbara Félix alerta para a importância de comparar as taxas e analisar o Custo Efetivo Total (CET), que inclui juros, seguros e taxas administrativas. “Uma taxa baixa pode esconder custos extras que encarecem o empréstimo”, diz. Golpes com consignados não solicitados, comuns entre aposentados, também preocupam os celetistas.

Aqui estão algumas dicas práticas:

  • Pesquise as taxas em vários bancos antes de contratar.
  • Verifique o CET para entender o custo real do empréstimo.
  • Evite fornecer dados pessoais a terceiros sem checar a instituição.
  • Contrate apenas por canais oficiais ou diretamente no banco.
  • Se receber um depósito não solicitado, não use o dinheiro e contate o banco imediatamente.

Em caso de problemas, os consumidores podem recorrer ao Banco Central, Procon, INSS ou ouvidorias dos bancos.

Impacto das taxas no bolso do trabalhador

As taxas elevadas do consignado privado têm um impacto direto no orçamento dos celetistas. Um empréstimo de R$ 10 mil a 6,49% ao mês, em 12 parcelas, resulta em um total de cerca de R$ 14.500 pagos, com juros de R$ 4.500. Já o mesmo valor a 1,80% ao mês, como no INSS, custaria aproximadamente R$ 11.800, uma diferença de R$ 2.700. Em prazos mais longos, como 48 meses, a disparidade cresce ainda mais, com o trabalhador privado pagando quase o dobro em juros.

Essa realidade reflete a falta de regulação para o setor privado, onde os bancos têm liberdade para definir alíquotas com base em seus próprios critérios. O novo consignado privado pode mudar esse cenário, mas, sem um teto, os especialistas temem que os trabalhadores continuem em desvantagem em relação a aposentados e servidores.

A média de 40,8% ao ano para celetistas, contra 21,9% para o INSS, mostra como a estabilidade de renda influencia os custos. Enquanto o governo aposta na concorrência para reduzir os juros, os consumidores precisam estar atentos para não cair em contratos abusivos.

Futuro do crédito consignado no Brasil

O lançamento do novo consignado privado em 2025 é visto como um passo para democratizar o acesso ao crédito, mas os desafios permanecem. Com mais de 40 milhões de trabalhadores CLT no país, o potencial de crescimento é enorme, especialmente em um mercado que já opera R$ 268 bilhões em contratos ativos. A possibilidade de contratar via aplicativo da Carteira de Trabalho Digital elimina barreiras burocráticas, mas a ausência de um limite de juros pode manter as taxas em patamares altos.

Para os aposentados, as sete reduções entre 2023 e 2024 trouxeram alívio, mas o ajuste para 1,80% em janeiro deste ano mostra que o ciclo de alta da Selic também os afeta. Já os servidores públicos, com taxas médias de 23,8% ao ano, seguem em uma posição intermediária, beneficiados pela estabilidade empregatícia. O consignado privado, por outro lado, ainda busca seu lugar, com a promessa de mais competição entre os bancos.

Enquanto as mudanças não chegam, os trabalhadores precisam navegar entre as opções disponíveis, comparando taxas e evitando ciladas. O consignado, mesmo com suas disparidades, continua sendo uma alternativa mais barata que o cartão de crédito ou o cheque especial, mas a desigualdade entre as categorias de tomadores evidencia a necessidade de políticas mais equilibradas no setor.