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Tarifa de Trump trava exportação de 95 toneladas de mel orgânico do Piauí para os EUA

Tarifa de Trump trava exportação de 95 toneladas de mel orgânico do Piauí para os EUA

mel orgânico do Piauí

A exportação de 95 toneladas de mel orgânico do Piauí para os Estados Unidos foi suspensa devido à tarifa de 50% anunciada pelo presidente Donald Trump, prevista para entrar em vigor em 1º de agosto de 2025. A Central de Cooperativas Apícolas do Semiárido Brasileiro (Casa Apis), sediada em Picos, a 314 km de Teresina, informou que compradores americanos cancelaram a compra temendo custos adicionais. A carga, pronta para embarque no Porto do Pecém, no Ceará, aguarda em cinco contêineres, enquanto negociações tentam reverter o impasse. O cancelamento, comunicado na sexta-feira (11), afeta pequenos produtores e a agricultura familiar, que dependem do mercado americano, principal destino do mel brasileiro. A situação expõe os desafios logísticos e econômicos enfrentados pela cadeia apícola nordestina.

A notícia pegou a Casa Apis de surpresa, especialmente por envolver um cliente de longa data. Segundo Sitônio Dantas, presidente da cooperativa, a decisão reflete o receio de que o mel chegue aos EUA já sob a nova taxação, inviabilizando a importação. A cooperativa, que já exportou mil toneladas de mel em 2025, enfrenta agora incertezas sobre o cumprimento de contratos firmados até o fim do ano.

O mel orgânico do Piauí, reconhecido por sua qualidade, é um dos principais produtos de exportação da região, e o cancelamento levanta preocupações sobre o futuro do setor.

Reação dos apicultores e desafios logísticos
A Casa Apis, que reúne 960 famílias de pequenos apicultores no Piauí e uma cooperativa no Ceará, enfrenta um golpe financeiro e emocional. Sitônio Dantas destacou que a suspensão dos embarques compromete não apenas a receita, mas também o planejamento de produção. A cooperativa, que opera com 50 mil colmeias, depende de um processo logístico complexo, que inclui transporte terrestre até o Porto do Pecém e trâmites aduaneiros rigorosos. Cada contêiner parado representa custos acumulados, desde a coleta do mel até a armazenagem portuária.

O presidente da Casa Apis enfatizou a relação de confiança com os compradores americanos, construída ao longo de anos. “Esse cliente investe até em nossos projetos sociais e ambientais. É uma parceria que vai além do comercial”, afirmou. A cooperativa agora busca alternativas para evitar perdas, como negociar prazos ou redirecionar a carga para outros mercados, embora isso seja desafiador devido à alta demanda americana por mel orgânico.

Por que o mel do Piauí é tão valorizado?
O Piauí se destaca na produção de mel orgânico devido à sua flora nativa diversificada, que inclui espécies como assa-peixe, angico e marmeleiro. Essa variedade garante sabores únicos e um produto livre de resíduos químicos, atendendo às exigências de mercados exigentes como os EUA. Em 2024, o estado liderou as exportações brasileiras de mel para o mercado americano, mesmo não sendo o maior produtor nacional.

A combinação de fatores naturais e práticas sustentáveis posiciona o Piauí como referência global, mas a nova tarifa ameaça essa conquista.

O peso do mercado americano na apicultura brasileira
Os Estados Unidos são o principal destino do mel brasileiro, absorvendo cerca de 80% da produção nacional. Em 2023, o Brasil exportou US$ 85,2 milhões em mel, com os EUA como maior comprador, seguidos por Alemanha e Canadá. A preferência pelo mel orgânico nordestino se deve à sua pureza e ao rigoroso controle de qualidade, que inclui análises químicas para detectar resíduos de antibióticos ou defensivos agrícolas.

A Casa Apis, por exemplo, segue padrões internacionais, com fiscalizações do Ministério da Agricultura. Cada lote exportado passa por sete análises químicas, garantindo conformidade com as normas americanas. A suspensão dos embarques, portanto, não é apenas um problema local, mas um alerta para toda a cadeia apícola brasileira, que pode perder competitividade frente a outros fornecedores globais, como Argentina e China.

A logística por trás da exportação
Exportar mel do Piauí envolve uma operação complexa. A carga sai de Picos, percorre mais de 500 km até o Porto do Pecém, em São Gonçalo do Amarante, no Ceará, e enfrenta trâmites aduaneiros antes do embarque. O Porto do Pecém é estratégico para o Nordeste, com infraestrutura que suporta grandes volumes de exportação, mas os custos logísticos são elevados.

Sitônio Dantas explicou que o transporte terrestre representa uma parte significativa do investimento. “Levar o mel até o porto é caro, e cada contêiner parado aumenta o prejuízo”, disse. Além disso, a Casa Apis planejava enviar outra carga na segunda-feira (14), mas a operação foi suspensa até que haja clareza sobre os embarques atuais.

Alternativas em negociação
A cooperativa aposta na mediação de sua representante nos EUA para reverter o cancelamento. A estratégia é convencer os compradores a receber a carga antes da vigência da tarifa, prevista para 1º de agosto. Outra possibilidade seria negociar preços que absorvam parte do impacto da taxação, mas isso reduziria a margem de lucro dos produtores.

A incerteza sobre o futuro das negociações mantém os apicultores em alerta, enquanto tentam minimizar perdas.

Histórico de sucesso da Casa Apis
Fundada em Picos, a Casa Apis é um exemplo de empreendedorismo solidário. Desde sua criação, a cooperativa investiu em tecnologia de ponta para processamento e embalagem, sendo a primeira do Brasil a elaborar planos de negócio e marketing para o mel. Hoje, reúne nove cooperativas, incluindo uma no Ceará, e beneficia diretamente 960 famílias.

Em 2024, a Casa Apis participou de rodadas de negócios promovidas pela ApexBrasil, gerando R$ 7,7 milhões em negociações com compradores de seis países. A visita de importadores a Picos e Oeiras reforçou a reputação do mel piauiense, que agora enfrenta um obstáculo inesperado com a tarifa americana.

O papel do Porto do Pecém na exportação
O Porto do Pecém é a principal porta de saída do mel nordestino para o mundo. Localizado a 56 km de Fortaleza, o terminal é um dos mais modernos do Brasil, com capacidade para movimentar grandes cargas. Em 2024, os portos brasileiros exportaram 21.144 toneladas de mel, um aumento de 26% em relação a 2023, segundo dados do Comex/Stat.

A retenção dos contêineres no Pecém, no entanto, expõe a vulnerabilidade do setor a mudanças bruscas no comércio internacional. Cada dia de espera eleva os custos de armazenagem e pode comprometer a qualidade do produto, que exige condições específicas de conservação.

Ameaça à agricultura familiar
A apicultura no Piauí é majoritariamente familiar, com pequenos produtores que dependem da venda do mel para sustento. A Casa Apis, ao centralizar a produção e exportação, garante escala e acesso a mercados globais, mas a tarifa de 50% pode reduzir a renda dessas famílias. “Somos pequenos, mas nosso mel é grande no mundo. Essa barreira nos machuca”, desabafou Sitônio Dantas.

O impacto vai além do financeiro. A suspensão dos embarques desmotiva investimentos em novas colmeias e tecnologias, essenciais para manter a competitividade. A cooperativa teme que a crise afete projetos sociais, como a capacitação de jovens apicultores e a preservação da caatinga.

Cenário global e concorrência
O Brasil é o maior exportador de mel orgânico do mundo, mas enfrenta concorrência de países como Argentina, China e Austrália. A tarifa americana pode abrir espaço para esses fornecedores, que já disputam o mercado com preços competitivos. A China, por exemplo, é líder em volume, mas enfrenta restrições devido a problemas de adulteração.

A qualidade do mel brasileiro, especialmente do Nordeste, é um diferencial, mas a taxação pode encarecer o produto, afastando consumidores americanos. A Casa Apis planeja intensificar contatos com compradores europeus, mas a transição exige tempo e novos acordos comerciais.

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