A possibilidade de incorporar o Wegovy, medicamento à base de semaglutida, ao Sistema Único de Saúde (SUS) está movimentando o cenário da saúde pública no Brasil. Com um pedido protocolado em 16 de dezembro de 2024 pela Novo Nordisk, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec) tem até 180 dias para analisar a solicitação, prazo que pode ser estendido por mais 90 dias. Caso o parecer seja favorável, o Ministério da Saúde terá até o final do ano para disponibilizar o tratamento na rede pública, marcando um avanço histórico no combate à obesidade. O foco inicial será em pacientes com obesidade grau II ou III (IMC igual ou superior a 35 kg/m²), acima de 45 anos, sem diabetes, mas com doenças cardiovasculares estabelecidas, como infarto ou AVC prévio. Enquanto a avaliação segue em fase de Chamada Pública até 19 de março, a expectativa cresce entre especialistas e pacientes que aguardam acesso a uma nova geração de fármacos contra a obesidade, ainda restrita à rede privada no país.
Disponibilizar o Wegovy no SUS pode ser um marco, já que atualmente a rede pública oferece apenas guias de orientação e cirurgia bariátrica para tratar a obesidade. A semaglutida, princípio ativo do medicamento, é reconhecida por sua eficácia em reduzir o peso e controlar o apetite, o que a torna uma ferramenta promissora para enfrentar um problema que afeta 25% dos brasileiros, segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde de 2020. Priscilla Mattar, vice-presidente médica da Novo Nordisk no Brasil, destacou que a empresa está em diálogo com o governo para viabilizar essa incorporação, atendendo a uma demanda crescente por soluções acessíveis.
Outro medicamento em análise é a liraglutida, indicada para pacientes com obesidade, diabetes tipo 2 e doenças cardiovasculares. Diferente do Ozempic, focado exclusivamente no diabetes tipo 2 e sem pedido de incorporação ao SUS até o momento, o Wegovy e a liraglutida podem abrir caminho para uma abordagem mais ampla e medicamentosa no sistema público, ampliando o alcance a milhões de brasileiros que hoje dependem de opções limitadas.
O avanço da semaglutida no Brasil
Incorporar a semaglutida ao SUS representa um passo significativo em um país onde a obesidade é uma epidemia crescente. Estudos apontam que o Brasil pode chegar a 48% de sua população adulta com obesidade até 2044, conforme projeções baseadas em tendências atuais. O Wegovy, já aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em janeiro de 2023 para controle de peso, tem se destacado no mercado privado, mas seu custo elevado – variando entre R$ 800 e R$ 2 mil por mês – o torna inacessível para a maioria. A análise da Conitec, iniciada em dezembro de 2024, é vista como uma oportunidade de mudar esse cenário, oferecendo o medicamento gratuitamente a grupos específicos.
A fase atual de Chamada Pública, que vai até 19 de março, permite que pacientes compartilhem suas experiências com a semaglutida, influenciando a decisão da comissão. Esse processo participativo é essencial para avaliar não apenas a eficácia clínica, mas também o impacto real do medicamento na vida das pessoas. Se aprovado, o Wegovy será distribuído a partir de dezembro, após a publicação da decisão no Diário Oficial da União (DOU), com o Ministério da Saúde tendo 180 dias para implementar a oferta.
Enquanto isso, a Novo Nordisk reforça seu compromisso com o Brasil. Priscilla Mattar enfatizou que as negociações com o governo visam atender uma necessidade de saúde pública, especialmente em um momento em que doenças associadas à obesidade, como problemas cardiovasculares, pressionam o sistema de saúde.
Um marco no combate à obesidade
Combater a obesidade no SUS tem sido um desafio histórico, limitado a orientações nutricionais e cirurgias bariátricas, que atendem apenas 0,2% dos pacientes elegíveis por ano, devido à alta demanda e à complexidade do procedimento. O Wegovy surge como uma alternativa inovadora, com ensaios clínicos do programa STEP mostrando que pacientes podem perder até 17% do peso corporal em 68 semanas, contra apenas 2,4% no grupo placebo. Esse resultado é atribuído à ação da semaglutida, que imita o hormônio GLP-1, reduzindo a fome e aumentando a saciedade.
A indicação inicial do medicamento no SUS será restrita a indivíduos com IMC acima de 35 kg/m², sem diabetes, mas com histórico de doenças cardiovasculares. Essa escolha reflete a preocupação com os custos elevados do tratamento – estimados em R$ 12,6 bilhões em cinco anos em uma análise anterior da Conitec sobre o Ozempic – e a necessidade de priorizar grupos de risco. Ainda assim, especialistas veem a possível incorporação como um primeiro passo para expandir o acesso a terapias medicamentosas no futuro.
Além do Wegovy, a liraglutida, presente em medicamentos como Saxenda, também está sob avaliação, com foco em pacientes com obesidade e diabetes tipo 2. Ambas as análises estão na fase de Chamada Pública, indicando que o SUS pode estar próximo de uma revolução no tratamento de condições crônicas ligadas ao peso.

Os desafios da incorporação ao SUS
Integrar o Wegovy ao SUS não é uma tarefa simples. O prazo de análise da Conitec, que começou em 16 de dezembro de 2024, pode se estender até setembro, caso os 90 dias adicionais sejam utilizados. Após um parecer favorável, a implementação depende de questões logísticas e financeiras, já que o Ministério da Saúde terá até dezembro para organizar a distribuição. O custo elevado do medicamento é um obstáculo significativo, especialmente em um sistema público que já enfrenta restrições orçamentárias.
No mercado privado, o preço do Wegovy reflete sua alta demanda e eficácia, mas também sua inacessibilidade. A Novo Nordisk, que detém a patente da semaglutida até março de 2026, produz o medicamento em plantas industriais fora do Brasil, o que encarece a importação. Especialistas estimam que a queda da patente pode reduzir os custos a longo prazo, mas até lá, o SUS precisará negociar valores viáveis para atender milhões de pacientes elegíveis.
A experiência com a liraglutida em algumas redes públicas estaduais, como no Rio de Janeiro e em Goiás, oferece um modelo inicial. Nessas regiões, o medicamento já é usado em protocolos específicos, mas a incorporação nacional exigirá um esforço coordenado para garantir suprimento e treinamento de profissionais de saúde.
Cronologia da avaliação do Wegovy
A trajetória do Wegovy rumo ao SUS segue etapas bem definidas, que ilustram o processo de incorporação de novas tecnologias no sistema público:
- 16 de dezembro de 2024: Novo Nordisk protocola o pedido de avaliação na Conitec.
- Março de 2025: Chamada Pública em andamento, com prazo até 19 de março para contribuições de pacientes.
- Junho a setembro de 2025: Conitec conclui análise inicial, com possível prorrogação de 90 dias.
- Dezembro de 2025: Prazo final para disponibilização, caso o parecer seja favorável e publicado no DOU.
Esse cronograma reflete a urgência de atender à crescente crise de obesidade, mas também os limites burocráticos e financeiros do SUS.
Benefícios e limitações do tratamento
Oferecer o Wegovy no SUS traria benefícios claros para a saúde pública. Dados do Atlas Mundial da Obesidade 2025 mostram que três em cada dez brasileiros vivem com obesidade, e a projeção para 2030 é de 119,16 milhões de adultos com IMC elevado. A semaglutida poderia reduzir complicações como hipertensão e doenças cardiovasculares, que custam bilhões ao sistema anualmente, além de melhorar a qualidade de vida dos pacientes.
Por outro lado, o acesso inicial será limitado a um grupo específico, deixando de fora milhões de pessoas com obesidade sem comorbidades cardiovasculares. A dose semanal de 2,4 mg, ajustada ao longo de 16 semanas a partir de 0,25 mg, exige acompanhamento médico rigoroso, o que pode sobrecarregar unidades de saúde já saturadas. Mesmo assim, a incorporação é vista como um avanço em um país onde o tratamento medicamentoso para obesidade ainda é uma lacuna no SUS.
A liraglutida, em avaliação paralela, segue um caminho semelhante, mas com foco em pacientes diabéticos. Sua aplicação diária, ao contrário da semanal do Wegovy, pode influenciar os custos e a adesão ao tratamento, fatores que a Conitec também considera.
O impacto na saúde pública brasileira
Ampliar o acesso à semaglutida no SUS poderia transformar o enfrentamento da obesidade no Brasil. Hoje, o sistema público atende pacientes com sobrepeso e obesidade por meio de acompanhamento nutricional e cirurgias, mas a oferta é insuficiente para a demanda. Em 2023, apenas 16 mil cirurgias bariátricas foram realizadas no SUS, número pequeno frente aos 41,6 milhões de brasileiros com obesidade, segundo estimativas baseadas na Pesquisa Nacional de Saúde.
O Wegovy atua no receptor GLP-1, reduzindo o apetite e a ingestão calórica, o que o torna uma alternativa menos invasiva que a cirurgia. Pacientes em ensaios clínicos relataram não só perda de peso, mas também melhorias em marcadores como pressão arterial e colesterol. No SUS, isso poderia aliviar a pressão sobre hospitais, que tratam complicações evitáveis da obesidade, como infartos e AVCs.
A iniciativa da Novo Nordisk, apoiada por entidades como a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e Síndrome Metabólica (Abeso), reflete a pressão por soluções modernas em um cenário de saúde pública desafiador.
Fatores que moldam a decisão da Conitec
Avaliar a incorporação do Wegovy envolve mais do que eficácia clínica. A Conitec considera segurança, custo-benefício e impacto orçamentário, analisando como o medicamento se compara a tratamentos existentes. Em 2023, um pedido similar para o Ozempic foi rejeitado devido ao custo estimado de R$ 12,6 bilhões em cinco anos, um precedente que preocupa especialistas sobre a viabilidade do Wegovy.
A Chamada Pública, encerrada em 19 de março, coleta depoimentos de pacientes que já usaram a semaglutida, oferecendo dados reais sobre adesão e efeitos colaterais, como náuseas e dores abdominais, relatados em até 40% dos casos. Esses relatos podem pesar na decisão, equilibrando os benefícios comprovados com os desafios de implementação.
A pressão pública também é um fator. O debate sobre a obesidade ganhou força após promessas como a do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, de oferecer semaglutida na rede municipal a partir de 2026, sinalizando uma demanda crescente por políticas locais e nacionais.
Curiosidades sobre o Wegovy e a semaglutida
O Wegovy e sua base, a semaglutida, trazem aspectos que destacam sua relevância no combate à obesidade:
- A semaglutida foi originalmente desenvolvida para diabetes, mas sua ação na perda de peso a levou ao Wegovy.
- Nos EUA, o custo mensal do medicamento chega a US$ 1.349 (cerca de R$ 7 mil), contra R$ 2 mil no Brasil.
- Estudos mostram que 50% dos pacientes mantêm a perda de peso após um ano de uso contínuo.
- A patente da Novo Nordisk expira em 2026, o que pode baratear o acesso no futuro.
Esses pontos ilustram o potencial transformador do Wegovy, mas também os desafios de torná-lo acessível em larga escala.
O futuro do tratamento no SUS
Vislumbrar o Wegovy no SUS até dezembro depende de uma série de variáveis. Se a Conitec aprovar a incorporação, o Ministério da Saúde precisará estruturar a compra, distribuição e treinamento de equipes em poucos meses, um desafio logístico em um sistema que atende 190 milhões de brasileiros. A experiência com a liraglutida, já usada em algumas unidades públicas, pode servir de base, mas a escala nacional é outro nível de complexidade.
A longo prazo, a queda da patente em 2026 abre portas para genéricos, reduzindo custos e ampliando o alcance. Enquanto isso, cidades como Rio de Janeiro e Palmas já planejam oferecer semaglutida localmente, indicando que o SUS pode adotar um modelo híbrido antes da incorporação total.
Para pacientes como os elegíveis ao Wegovy – com obesidade grave e riscos cardiovasculares –, a espera por dezembro representa uma esperança concreta de tratamento acessível, em um país onde a obesidade segue como um dos maiores desafios de saúde pública.