Se você nunca ficou preso num ônibus quebrado em Rio Branco, parabéns: ou você anda de Uber, ou ainda não entendeu o que é viver no Acre urbano. Para o resto da população, o roteiro é sempre o mesmo: motor tossindo, barulho metálico, motorista suspirando, calor subindo, gente suando e a viagem virando uma sauna coletiva. No manual do passageiro não tem protocolo para isso: ninguém é ressarcido, o motorista não sabe o que dizer, e a substituição só chega quando a paciência já quebrou junto com o ônibus.
As causas são conhecidas: frota mais velha que promessa de político, pistas esburacadas que parecem rally, motoristas que viram pilotos de roleta russa mecânica, e uma gestão que joga a culpa de um lado para o outro enquanto o passageiro paga caro para sofrer. Resultado: cada viagem vira um reality show de improviso. Ônibus quebra no meio da pista e você descobre que tem talento para sauna grátis. O cheiro de suor é edição limitada, com direito a coleção completa de desodorantes vencidos. Sempre tem alguém no viva-voz narrando a vida inteira: “Ô mãe, tô indo comprar pão” e você adota o trauma de tabela. Quando o motorista resolve brincar de Fórmula 1, você entra com duas pernas e sai com labirintite. O banco assassino, com molas afiadas estilo Tramontina, completa o cenário. O ar-condicionado existe, mas só no imaginário; o botão funciona igual promessa de campanha. E se não bastasse, a clássica parada surpresa: “Desce logo aí, fia, que eu tenho pressa.”
No mesmo ônibus ainda cabe o passageiro do perfume nuclear — aquele que toma banho de Essência 43 e intoxica o coletivo inteiro —, o ninja atravessador de corredor pisando em pés e almas, e claro, o DJ improvisado que solta funk no último volume, transformando o trajeto em balada gratuita. Se você pagar com 20 reais, recebe passagem e troco em arsenal de Tridents. E quando chove, a simulação do Dilúvio municipal: janela emperrada, água entrando, meia encharcada, e o passageiro rezando pra chegar inteiro.
O melhor são as desculpas oficiais do trabalhador refém do busão: “Chefe, o ônibus só volta quando o Wi-Fi da prefeitura pegar.” Ou: “Patrão, o cobrador esqueceu de dar corda no motor.” Tem também: “O motorista pediu pra cada passageiro soprar o motor, tipo bolo de aniversário.” E a clássica: “O ônibus travou na segunda marcha, estamos vindo em procissão de Nossa Senhora.” Se depender da criatividade, o acreano já tem PhD em desculpas de transporte.
E para encerrar, o nosso FAQ irônico: por que os ônibus quebram tanto? Porque já são peças de museu. Existe manual quando quebra? Sim: respire fundo e aceite o destino. Vou ser ressarcido? Claro que não, mas ganha uma desculpa pronta pro chefe. A culpa é do motorista? Não, ele só pilota a carroça. As pistas ajudam? Óbvio: rally Dakar versão Acre. Tem manutenção regular? Sim, regular no estilo acreano: quebrou, conserta; não quebrou, empurra. Por que a passagem é tão cara? Porque você paga pela emoção radical. O que fazer quando quebra? Ponha sua máscara de paciência e poste no Instagram. Quem fiscaliza? Todo mundo aponta o dedo, mas ninguém segura a chave de boca. Até quando? Até a paciência do passageiro quebrar antes do motor.
E assim seguimos: se em aviões caem máscaras de oxigênio, nos ônibus de Rio Branco o que cai mesmo são os parafusos. Cada viagem é uma roleta russa mecânica, onde a única certeza é que o passageiro vai chegar atrasado — mas pelo menos com uma boa história para compartilhar.






