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O espelho rachado da soberania ocidental

O espelho rachado da soberania ocidental

O espelho rachado da soberania ocidental

Quando a Casa Branca se dá ao trabalho de responder a um presidente estrangeiro para defender a reputação de um adversário interno, é sinal de que o espelho da democracia americana está mais trincado do que parece. A frase — “Trump não está tentando ser imperador do mundo” — soa menos como uma constatação e mais como um recado diplomático disfarçado de reparo: contenha-se, presidente Lula, não projete nos outros os delírios que orbitam por aqui.

É curioso ver o presidente do Brasil, que sempre clamou por autodeterminação dos povos e soberania nacional, comentar com desenvoltura sobre a política interna de uma nação que ainda comanda a ordem global. Mais curioso ainda é assistir aos Estados Unidos, tradicionalmente avessos a admitir ruídos em casa, agirem como um pai protetor diante de um filho falastrão. A atitude de Lula ao insinuar que Trump almeja ser uma espécie de César moderno revela, no mínimo, uma imprudência diplomática. E a resposta americana, apesar de revestida de civilidade, carrega a rigidez de quem já não tolera que peões comentem os movimentos da rainha.

A história recente ensina que toda vez que líderes sul-americanos ousam apontar o dedo para o Norte, o preço vem em forma de isolamento, reprimenda ou recado público. Em 2003, quando Lula, ainda no primeiro mandato, tentou um jogo duplo entre Washington e Caracas, a diplomacia americana reagiu com frieza. Em 2010, ao tentar intermediar a questão nuclear iraniana com Turquia e Irã, o Brasil ouviu de Hillary Clinton um elegante “não nos atrapalhe”. Agora, em 2024, volta ao jogo de protagonismo retórico e ouve uma sutil chamada de atenção: o senhor não entendeu Trump. E tampouco deve julgá-lo.

A metáfora do “imperador do mundo” tem sabor anacrônico, mas não por acaso. Em tempos de instabilidade global, as potências voltam a se olhar com os olhos da Roma Antiga: quem lidera, quem obedece, quem trai. A diferença é que, no Coliseu moderno, os gladiadores não empunham espadas, mas algoritmos, narrativas e alianças comerciais. E se há um candidato que movimenta multidões com discurso de força e nacionalismo exacerbado, é Trump. Chamar-lhe de “imperador” pode ser um exagero, mas não é um delírio. É uma metáfora, sim, mas uma que diz muito sobre o que o Brasil vê — ou teme — no retorno de um líder imprevisível ao centro do xadrez mundial.

Resta saber por que o presidente Lula, sempre cauteloso em temas internacionais, resolveu acender esse fósforo no barril de pólvora geopolítico. Seria um gesto ensaiado para sinalizar alinhamento com os democratas? Um recado interno travestido de comentário externo? Ou, simplesmente, o velho impulso de dizer o que pensa, sem medir as ondas que provocará?

O fato é que a diplomacia não é palco para bravatas, nem para epigramas presidenciais. Cada palavra dita por um chefe de Estado tem peso, eco e consequência. A Casa Branca, ao responder de forma tão direta, não defendeu apenas Trump. Defendeu a si mesma, suas instituições e, mais importante, a ideia de que só os americanos devem julgar os seus líderes. O Brasil, que vive às voltas com suas próprias crises de autoridade e identidade, deveria escutar esse recado com humildade institucional.

Porque entre presidentes que se acham imperadores e diplomatas que agem como vassalos, a única certeza é que o povo — aqui e lá — continua esperando por líderes que governem como servidores da Nação, e não como aspirantes a tronos ideológicos.

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