
As exportações brasileiras para os Estados Unidos, que alcançaram um recorde de US$ 40,3 bilhões em 2024, enfrentam um novo desafio com a imposição de uma tarifa de 50% anunciada pelo presidente norte-americano, Donald Trump, a partir de 1º de agosto de 2025. A medida, que abrange produtos como café, carne, suco de laranja, petróleo e aeronaves, pode reduzir drasticamente o fluxo comercial com o segundo maior destino das vendas externas do Brasil, atrás apenas da China. Setores estratégicos da economia brasileira, como agronegócio e indústria de transformação, já avaliam os impactos, enquanto analistas preveem perdas de bilhões de dólares. A tarifa, que não será cumulativa a taxas já existentes sobre automóveis, aço e alumínio, preocupa empresas como Embraer, Suzano e Minerva, que dependem fortemente do mercado norte-americano. O governo brasileiro estuda medidas de resposta, incluindo a Lei da Reciprocidade, para mitigar os efeitos.
O comércio bilateral Brasil-EUA atingiu níveis históricos em 2024, com 40,7 milhões de toneladas exportadas, um crescimento de 9,9% em relação a 2023. A relevância dos Estados Unidos como destino de bens de alto valor agregado, como aeronaves e máquinas, reforça a gravidade da tarifa. A indústria de transformação, que representou 78,3% das exportações brasileiras para os EUA, teme perdas significativas. A seguir, alguns dos setores mais afetados:
- Café: Principal produto agrícola exportado, com US$ 2 bilhões em vendas.
- Petróleo: US$ 5,8 bilhões exportados, mas com possibilidade de redirecionamento.
- Aeronaves: Setor liderado pela Embraer, com US$ 2,4 bilhões em receita.
- Carne bovina: Segundo maior mercado, com 532.653 toneladas exportadas.
A medida de Trump, justificada como proteção à indústria norte-americana, já provoca reações no Brasil, com o governo e o setor privado buscando alternativas para minimizar os impactos. O mercado internacional, no entanto, pode não absorver o excedente de produtos redirecionados, especialmente no agronegócio.
Principais produtos sob pressão
A pauta de exportações brasileiras para os EUA é diversificada, mas alguns produtos se destacam pelo volume e pela dependência do mercado norte-americano. O café, por exemplo, é um dos pilares do agronegócio brasileiro, com os EUA absorvendo 16,7% do total exportado em 2024, equivalente a quase US$ 2 bilhões. A consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio alerta que a tarifa de 50% comprimirá as margens dos produtores, elevando os preços para os consumidores norte-americanos. O Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) reforça que o impacto será sentido diretamente no bolso do público dos EUA, o que pode reduzir a demanda.
Outro setor vulnerável é o de carne bovina, que gerou US$ 1,637 bilhão em 2024, com os EUA como segundo maior comprador. A Minerva, uma das gigantes do setor, estima que a tarifa pode reduzir até 5% de sua receita líquida. Empresas como JBS e Marfrig, que possuem operações nos EUA, podem mitigar parte dos prejuízos, mas a cadeia produtiva brasileira ainda enfrenta riscos. A carne brasileira, reconhecida por sua qualidade, compete com fornecedores como Austrália e Argentina, que podem ganhar espaço no mercado norte-americano.
O suco de laranja, com exportações de US$ 1,31 bilhão em 2024, enfrenta uma situação ainda mais delicada. Os EUA, segundo maior destino, responderam por 41,7% das vendas na safra 2024/25. A tarifa de 50% representa um aumento de 533% sobre os US$ 415 por tonelada já cobrados, o que a CitrusBR considera “insustentável”. A consultoria Cogo prevê uma queda drástica na competitividade, com risco de colapso para a cadeia citrícola, já que outros mercados, como a Europa, não têm capacidade para absorver o excedente.
Impactos na indústria de transformação
A indústria de transformação brasileira, que respondeu por US$ 31,6 bilhões das exportações para os EUA em 2024, é um dos setores mais expostos à nova tarifa. Aeronaves, lideradas pela Embraer, geraram US$ 2,4 bilhões, representando 63% do total exportado no segmento. A dependência do mercado norte-americano torna a empresa particularmente vulnerável, embora sua presença global possa ajudar a amortecer os impactos. Produtos semimanufaturados de ferro ou aço, com US$ 2,8 bilhões em vendas, também enfrentam desafios, já que os EUA absorvem mais de 70% das exportações brasileiras nesse setor.
Máquinas, motores e geradores, com US$ 1,3 bilhão exportados, são outro ponto de preocupação. A WEG, uma das principais empresas do setor, já é vista como uma das mais impactadas, segundo o UBS BB. O segmento de eletroeletrônicos, que movimentou US$ 1,1 bilhão apenas no primeiro semestre de 2024, também sente a pressão. A Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee) destaca que os EUA são o principal destino das exportações do setor, e a tarifa pode comprometer a competitividade de produtos brasileiros frente a concorrentes asiáticos.
- Aeronaves: US$ 2,4 bilhões, com 63% do total exportado para os EUA.
- Ferro e aço: US$ 2,8 bilhões, com 70% das vendas destinadas aos EUA.
- Máquinas e motores: US$ 1,3 bilhões, com impacto direto na WEG.
- Eletroeletrônicos: US$ 1,1 bilhão no primeiro semestre de 2024.
Setores com menor vulnerabilidade
Nem todos os setores enfrentam o mesmo nível de risco. O petróleo, que gerou US$ 5,8 bilhões em exportações para os EUA em 2024, é considerado menos afetado. O BTG Pactual avalia que, mesmo com a tarifa, o impacto seria “modesto”, já que o setor possui flexibilidade para redirecionar embarques a outros mercados, como Ásia e Europa. A Petrobras, por exemplo, destinou apenas 4% de seu petróleo exportado aos EUA no primeiro trimestre de 2024, contra 9% no mesmo período do ano anterior. Derivados do petróleo, como combustíveis, têm os EUA como segundo maior destino, com 37% das exportações, mas também podem encontrar novos compradores.
Produtos de madeira, com US$ 1,6 bilhão exportados, enfrentam concorrência de países como Canadá e Chile, mas a Suzano, líder no setor de celulose, pode se beneficiar de seus baixos custos e escala global, segundo o Citi. A empresa, que obtém 15% de sua receita nos EUA, tem flexibilidade para realocar volumes, embora enfrente dificuldades no curto prazo. Materiais de construção e engenharia, com US$ 2,2 bilhões exportados, também podem buscar novos mercados, mas a dependência de 58% dos EUA limita as opções.
Respostas do governo e do setor privado
O governo brasileiro, sob a liderança do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sinalizou uma possível resposta à tarifa com base na Lei da Reciprocidade, que permite retaliar medidas protecionistas de outros países. Embora detalhes ainda não tenham sido divulgados, a estratégia pode incluir tarifas sobre produtos norte-americanos importados, como gás natural, que representou 55% do crescimento das importações brasileiras dos EUA em 2024, totalizando US$ 40,6 bilhões. O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) monitora a situação, enquanto a ApexBrasil, agência de promoção de exportações, já identifica cerca de mil oportunidades para diversificar mercados nos EUA, apesar do cenário tarifário.
O setor privado, por sua vez, busca estratégias de mitigação. Empresas como Embraer e WEG investem em inovação e eficiência para manter a competitividade, enquanto o agronegócio explora mercados alternativos, como Egito e Emirados Árabes Unidos, que cresceram 91,4% e 46% em 2024, respectivamente. A diversificação, no entanto, enfrenta limitações, já que a capacidade de absorção de mercados como Ásia e Europa é restrita para produtos como suco de laranja e café.
- Lei da Reciprocidade: Possível resposta do Brasil a tarifas protecionistas.
- Diversificação de mercados: Egito e Emirados Árabes como destinos crescentes.
- Inovação: Empresas como Embraer buscam eficiência para enfrentar a tarifa.
- ApexBrasil: Identifica mil oportunidades para exportações nos EUA.
Perspectivas para o comércio bilateral
O comércio Brasil-EUA, que atingiu US$ 80,9 bilhões em 2024, com crescimento de 8,2% em relação a 2023, enfrenta um momento de incerteza. A Amcham Brasil prevê que o fluxo comercial permanecerá robusto em 2025, impulsionado pelo crescimento projetado de 2,8% no PIB dos EUA e 2% no do Brasil, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). No entanto, a tarifa de 50% pode alterar essa trajetória, especialmente para setores dependentes do mercado norte-americano. A indústria de transformação, que cresceu 5,8% em 2024, é a mais exposta, enquanto o agronegócio busca se adaptar a um cenário de margens reduzidas.
A resposta do Brasil dependerá de negociações bilaterais e da capacidade de diversificar destinos. Produtos como café e suco de laranja, que enfrentam barreiras significativas, exigem estratégias urgentes, enquanto setores como petróleo e celulose têm maior margem de manobra. A tarifa, embora desafiadora, pode acelerar esforços de inovação e abertura de novos mercados, mas o impacto imediato será sentido em cadeias produtivas estratégicas.
