Nem a noite gelada de quarta-feira (12/11) intimidou o agricultor alemão Andreas Dittmann em seguir com a colheita de beterraba doce madrugada adentro, na cidade de Gottingen, na Alemanha.
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Ele é um dos mais de 200 integrantes da Associação de Produtores de Beterraba da Baixa-Saxônia, que compartilham maquinários para avançar 24 horas por dia e sete dias por semana a fim de concluir a colheita até meados de novembro. Caso não consigam, o risco é ver a produção congelada e perdida embaixo da terra.
O solo congelado impede a operação das grandes colhedoras especializadas em beterraba, que chegam a pesar 25 toneladas e custar 700 mil euros.
Alemão colhe beterraba por 24 horas
Segundo Andreas, o período de estresse começa no fim de outubro. “A partir dali, a máquina roda direto para tirar as beterrabas da terra. Se o clima vira com nevascas ou muito frio, não sai mais nada do solo”, afirma.
A temporada oficial começa em meados de setembro e, em anos normais, fecha por volta de 15 de novembro. Mas os últimos ciclos têm sido muito diferentes do “normal”.
Em 2024, chuvas persistentes obrigaram Dittmann e os colegas a seguir arrancando beterraba até dezembro, em meio à neve e gelo. “Fomos até o limite, mas, ainda assim, tivemos muitas perdas”, lembra.
O ritmo é puxado, com turnos de 12 horas divididos entre madrugada e dia. Até mesmo o deslocamento das colhedoras precisa ser planejado. Assim, a colheita é realizada em áreas maiores à noite, quando o tráfego é menor, enquanto os talhões pequenos ficam para o período diurno.
A cooperativa chega a deslocar as máquinas por mais de 100 quilômetros, rumo ao leste, onde há áreas maiores, de 50 a 100 hectares. O trajeto é sempre pelas estradas secundárias, já que os equipamentos são largos demais para a autobahn. A estrada não tem limite de velocidade máxima, mas, sim, de mínima a 40 km/h.
O ritmo é puxado, com turnos de 12 horas divididos entre madrugada e dia
Daniel Azevedo Duarte
Beterraba vs cana
A produtividade da beterraba doce varia entre 60 e 120 toneladas por hectare, e cada máquina chega a colher um hectare por hora. Nesta temporada, Andreas tem obtido cerca de 100 toneladas por hectare, mas o bom desempenho não está se refletindo no bolso.
De acordo com ele, o mercado global do açúcar despencou para cerca de 400 euros por tonelada. O preço pago ao produtor caiu de 60 euros por tonelada nos últimos anos para cerca de 45 euros em 2025.
“O preço desabou. Se tivermos quebra de produção como no ano passado, não conseguiremos fechar as contas”, resume Dittmann.
A Alemanha cultiva cerca de 385 mil hectares de beterraba doce, cuja produtividade de açúcar por tonelada varia entre 15% e 18% do peso total. Como comparação, a de cana-de-açúcar fica entre 11% e 15%.
Após a colheita, as beterrabas ficam estocadas nas bordas dos talhões por períodos cada vez mais longos. No início da temporada, quando ainda está mais menos frio, o ideal é deixar por quatro ou cinco dias no máximo.
Com o tempo mais frio, esse tempo salta para até dez semanas. As últimas cargas só serão despachadas em meados de janeiro. Para evitar perdas, os montes são cobertos com manta especial. Daí, o maior risco não é congelar, mas, sim, descongelar.
“Se fizer –15°C ou –20°C por semanas e depois esquentar, elas começam a estragar”, explica.
Trabalho em equipe
Seis a sete agricultores e estudantes, todos membros da cooperativa, se revezam nas cabines da colhedora nos picos de demanda. Dittmann segue essa rotina ano após ano, conciliando sua própria fazenda com o trabalho coletivo pela cooperativa.
Ele destaca que tecnologia das máquinas mais modernas não garante, por si só, altas produtividades. Ele próprio usa uma semeadora de 50 anos em sua propriedade e produz tão bem quanto vizinhos com máquinas novas.
“O que faz diferença é o manejo do solo. Culturas de cobertura, como a mostarda, podem deixar até 100 kg de nitrogênio por hectare. Isso reduz a adubação mineral e preserva o teor de açúcar da beterraba, que cai se houver excesso de nitrogênio”, explica.
A cooperativa opera um modelo específico de colhedora mais “rústica”, escolhida não pela velocidade, mas pelo custo de manutenção. Equipamentos de outras marcas chegaram a custar o dobro em reparos, levando o grupo a padronizar a frota para reduzir gastos e manter a logística sob controle.
*O jornalista viajou à Alemanha a convite da DLG, organizadora da Agritechnica





